quarta-feira, 13 de março de 2019

O ovo narcísico...

O Ovo Narcísico...
   Estamos juntos, frente a frente e não sei o que dizer.
   Tive outros 3 durante minha vida, nenhum como você!
   Porque os outros, ao fim da espera, mesmo apesar do receio, de ansiedade e expectativas, ousaram quebrar-se e se comprometer e nascer. E juntos vivemos descobertas, medos,dores e alegrias, momentos de tantos diferentes sentimentos até que um dia criaram asas e partiram. De tudo, mas de tudo mesmo, o que ficou de sólido sem sombra de qualquer mínima dúvida, embora indescritível e sem medida que precisasse ter para ser ou comparar-se com outro que é... o que sobrou foi real, foi saber-se Amor. E desta experiência de amor e de tantas horas de minha vida roubadas por ele, por este amor, me veio tanta coisa mais, ainda que o destino sabido fosse o desprendimento, a despedida no ensaio da independência e libertação, desde o primeiro abraço! O que tínhamos era algo que eu já sabia, estava fadado a transformar-se para terminar do jeito que tinha sido, mas ficar de um jeito que vive para sempre.
  Mas você... olho e vejo você, este enorme ovo...e nós...o que posso dizer?
  O que posso compreender e saber de mim, do que sou, do que realizei, ou do que fomos enquanto juntos, o que verdadeiramente é real, se nem te conheço?! Mesmo após tanto tempo!
  Se olho para você e te conheço, se pelo menos nos comprometêssemos a ponto de você  mostrar uma parte verdadeira de sua face quando olha para mim e comigo está, por este motivo, ato de amor, encontraríamos nossos limites individuais, nos reconheceríamos sabendo em comparação o que somos e o que não somos, nos conheceríamos um pouco melhor. Acabaríamos por saber o que fizemos de "nós". Foi paixão e depois amor, e medo e depois amor, e erros, acertos, tentativas, algumas perdas e finalmente amor? O que foi isto afinal? O que é este ovo?
   De um jeito ou outro, desde que conheci sua história e o "milagre" que era sua existência, foi desde então que, há 47 anos o levo junto a mim, pra todo lado. Até mesmo quando, por pouco tempo me afastei de você. Eu o carreguei tantas vezes! Esquentava este seu corpo ovalado, protegendo-o muitas vezes de si mesmo quando saía rolando desembestado de encontro a tudo e qualquer coisa, num impulso de movimento rebelde e amalucado. Muitas vezes ia junto e me agarrava à sua casca resistente e rugosa feito ovo de avestruz e, romanticamente porque por muito tempo era assim que eu era, aventurava-me e o acompanhava, encontrando motivo para sorrir. Usava escudo e espada brilhante em defesa do filho do ovo que não eclodiu!  Pra falar a verdade, reconheço que, rir mesmo, mas rir de gosto ou rir junto foi raro. Talvez porque eu fosse mesmo sem graça e só sabia rir em sonhos ou por dentro de mim mesma, ou talvez porque você não me dava, afinal, a cara sorridente.
   Posso jurar, no entanto, que muito tempo foi aquele em que mesmo do meu jeito, calma e discretamente, sei que tinha tendência ao jogo do contente, e a cada manhã o sol me lembrava de como gosto da luz e a reconhecia por saber que tenho, lá dentro de mim, uma pedra que brilhava incessantemente. Mesmo apesar da chuva, tropeços ou lama, cada novo dia era, pra mim, um dia de sol. Um dia que prometia... Eu tinha fé.
  E olhava pra você, com a mesma ansiedade que se espera o romper da placenta do primeiro e amado filho esperado, ou de quantos vierem porque foi isto que escolhemos, eu esperava esta sua casca romper.
  - Seja! seja!! eu desejava. Com fé eu desejava.
  Mas eu morri muitas vezes, e renasci, ou rejuntei cacos, ou refiz minhas forças, pensando que éramos um só e a tudo venceríamos. Certo que devo fazer um aparte... durante as batalhas ou caminhos pedregosos, íamos de fato juntos, agarrados, todas as vezes. Contudo, após vencido o obstáculo ou o movimento desembestado, e em segurança, este ovo parecia dobrar de tamanho e a vitória parecia ser apenas sua. Me perdi tantas vezes pelo caminho, nestas ocasiões, que cheguei a duvidar de mim mesma. O que era eu? Afinal, queria ver nascer finalmente o milagre que estava no ovo, mas eu, o que era??? Eu não sabia nada, você tudo sabia! Eu era fraca? não sentia raiva? você era pura ira que transpirava por seus poros na casca na qual eu adormecia. Eu não podia sentir uma pontinha de raiva porque você a transformava em algo seu - e tão grande, maior do que eu poderia ou queria assumir. O tempo passava e eu aprendia como não despertar a ira dos deuses, ou das pessoas ou de mim mesma, tentando viver mais brandamente do que precisaria. Sublimava sentimentos ruins, não sei se para ser nobre ou para amortece-los e renovar a energia do ninho. 
  Passei por todas as fases. Cortei minhas asas, depois as recuperei para perdê-las após algum tempo, ou transformá-las em garras com dedos tortos e doloridos. Eu não sentia raiva mas Vivi na luz e na sombra, enfrentei meus próprios medos, cozinhei milhares de horas em banho-maria, e de tão medrosa hoje pelo menos sei que sou corajosa. É hoje, das poucas coisas que sei de mim. Esperei e esperei que este Ovo eclodisse. Até meu ninho no galho das árvores talvez já esteja perdido!
  - Seja! Seja, por favor!! Já nem precisa mais hoje, ser Amor!
  Nem precisava mais ser Amor aquilo que eu esperava ver nascer cheio de luz deste ovo. Basta tranquilidade, paz, basta ser uma carinhosa mão de apoio para andarmos por caminhos mais brandos e lembrar nossa história enquanto terminamos de envelhecer. Vamos ficar pra semente no coração e pra sempre como exemplo para aqueles que de nós, voaram? Vamos, por favor! Que herança deixaremos?
  Eu não lutava pelos "meus"  sonhos, mas pelos meus, que são outros, não apenas eu mesma.
  Nada parece abalar este que vejo em minha frente. Nada quebra esta casca rígida, perfeita e resolvida. Contudo, olho pra você, e não estou nem mais triste como algumas vezes fiquei, nem com esperança, nem sei dizer mais com que face olho pra você pois, neste tempo confesso, não foi mais fácil me conhecer. Nem mais tenho a pretensão de envelhecer sábia! Não me sinto vítima. Nem me sinto em pedaços, mas não estou inteira. Não sei respostas, nem o que teria sido mais correto. Meus olhos envelhecem mas, que pena, neste momento me fazem ver com clareza apenas o que sinto, e não sei se é para sempre, nem sei mesmo como posso ter coragem de dizer... Como vou dizer, amado e desejado Ser não nascido,  do ovo que cuidei por tantos anos?
  - Sinto muito, não quero mais ( não tenho mais estrutura, não sou boa o bastante).. ou será que interiorizei o que você e sua negação em eclodir e viver me mostraram como sendo uma real atitude de fria negação acima de qualquer promessa? ...sim porque palavras são promessas e um ovo é uma promessa... algo em potência... algo que ouvi tantas vezes como promessa mas que não vi se fazer.. Seja! Seja!!!
  Aliás, tanta incoerência me deixaram quase doida. Isto é amor? mas ainda nem nasceu! Será que sou eu que não sei mais compreender as coisas? Isto ainda é um ovo que eu cuido e espero, espero, espero? Como posso olhar para este enorme ovo, que hoje pesa mais do que eu, quando no inicio parecíamos iguais, e dizer..
  - Sinto muito, não quero mais ser responsável por você!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seu comentário será bem vindo! Obrigada.

Clic para compartilhar com...

Compartilhe, mas mantenha minha autoria, não modifique,não uso comercial

 
BlogBlogs.Com.Br
diHITT - Notícias