Era uma noite silenciosa. Eu me demorava a
dormir. Então, o som me envolveu. Não sabia de onde vinha porque até aquele
momento o silêncio, o teu silêncio, era de morte. Havia uma ausência tão
palpável que se podia até ouvir o pulsar daquelas paredes como se tivessem vida
apesar do vazio. E no escuro daquela noite em que não consegui entregar-me ao
sono, a respiração curta impedia o ar de preencher todo o espaço que ali havia
para ser preenchido.
E eu respirava como se tivesse preguiça de
viver. Aquele espaço vazio e negro me assustou por momentos. Onde eu estava? Meus
olhos, tanto quanto eu, estavam fechados. Lentamente os abri, por um segundo.
Apenas por um rápido instante. Voltei a sentir o pulsar daquelas paredes. E naquele
quarto, convenci a mim mesma que estava segura. Todo vazio assusta, pensei.
Nada demais. É preciso apenas coragem para continuar a respirar e crer que tudo
vai passar. Porque tudo passa.
A saudade, a falta, o desejo daquilo que não
podia mais ser sentido, culpa da ausência e do tempo, passariam, não iriam mais atormentar meu sono.
E eu recordaria tudo e esta noite, como vaga lembrança de algo que, um dia e
por muito tempo, pareceu eterno. Tudo se transforma. Nada permanece como foi um
dia. Nem eu! Seria mesmo verdade que tudo passa, mesmo as mais raras e valiosas
presenças? Não estariam para sempre marcadas em nós? Ah ! estes tesouros a
ornamentar nosso aposento mais íntimo. Nem todos igualmente preciosos, mas cada
um com inestimável valor. Talvez naquele mesmo aposento em que me encontrava
agora, houvesse uma vida escondida dos olhares, e que pulsava, tão eterna
quanto posso ser, e enquanto eu for.
Então, tudo passa... mesmo a mais
indispensável de nossas inspirações. Porque um dia, talvez deixemos de crer em
nossa capacidade de amar ingenuamente e para sempre.
Passa
sim, pensei, tudo passa, nem que para isto tenhamos de perder a memória que nos
faz ser o que somos. Nem que um dia, acordemos no meio de um quarto que não nos
diga respeito, onde não possamos nos reconhecer, esquecidos de tudo e
assustados, ou por tão esquecidos, talvez sossegados, para sempre ingênuos,
eternas crianças.
Tudo
passa também ao olhar consciente mas superficial, embora muito fique escondido,
quase silencioso, camuflado em nossa pele. Como de pele era aquele quarto.
Aquele em que me encontrei naquela noite, incrivelmente consciente de uma
ausência.
E ele, que pouco tempo antes tinha voltado a
pulsar descompassado, quente, úmido e ansioso diante das promessas da vida, agora,
a despeito de mim e do tempo, ainda batia, mais lento porém ritmado. E eu o
ouvia, no silêncio da noite. Então, ainda estás aí, no meu peito?! Agora, eu o sabia ainda vivo
e calmo, a despeito de tudo e do vazio. Porque o vazio é talvez um espaço
necessário ou, por vezes, inevitável.
De olhos fechados, a languidez foi tomando
conta do meu corpo, embalado pelo som que vinha do pulsar daquelas paredes, que
jamais foram frias e onde eu sempre podia me resguardar. Eu não sabia mais se estava nele
ou ele em mim....
Texto: Vera Alvarenga
Foto retirada do Google
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