terça-feira, 11 de outubro de 2011

Dia das crianças...

Amanhã é dia das Crianças. Estava lembrando de quando era uma delas. Tinha 2 irmãos mais velhos que podiam brincar na rua, eu não, pois era menina e morávamos em São Paulo! Meu pai trabalhava no Hospital das Clínicas, um dos responsáveis pelo Setor de Custos daquela imensidão. Pessoa simples, carinhosa, humanitária, ensinou-me que um sorriso sincero era algo bom a oferecer ao cumprimentar as pessoas, naquele ambiente onde elas estavam preocupadas ou com dor. Sua ambição parecia se resumir ao viver em paz e tranqüilidade, poder escrever suas poesias e pescar, de vez em quando. Além disto, às vezes pegava o carro e no domingo dizia: - Vamos até o alto da serra, comer pão de semolina com mortadela...e lá íamos nós. Adorava o miolo daquela enorme fatia de pão - era uma delícia.
Minha mãe, também trabalhava fora e embora não muito afeita a carinhos físicos, era humanitária, ajudava pessoas que chegavam para atendimento no INPS,vindas de outras cidades, sem dinheiro para um lanche, às vezes. Animada, ambiciosa embora não em exagero, social, agitada, não esquecia de presentear aniversariantes, dizendo que uma data especial não podia passar em branco. Ensinou-me, com seu exemplo, sobre a disciplina, a força de vontade e persistência. Dizia que a ambição é necessária para um futuro mais seguro e que a vaidade era fundamental...neste último quesito eu fui uma péssima aluna, mas aprendi por observá-la, a importância nos apresentarmos bem socialmente ou no trabalho. Ambos tinham “caráter”,princípios dignos e eram honestos. Tive sorte em ter pais como eles.
  Fui feliz na infância. Nenhum grande trauma, nenhum drama. O que me faltou? Hummm... bicicleta, piano, oportunidade de estudar ballet. Dizem que eu dançava bem, desde pequenina. Tais faltas materiais fizeram parte do aprender a lidar com frustrações, mas, na verdade, não me lembro de frustrar-me por muito tempo, inventava outra coisa pra fazer, como tocar violão, e com ele, compunha minhas músicas. Sentia-me um pouco só, mas com isto me habituei a ficar bem comigo mesma. Quando tinha quase 8 anos nasceu minha irmã, para mim uma boneca viva, e eu adorava ajudar a empregada a tomar conta dela na ausência de minha mãe durante o tempo que ficava no trabalho. O fato de viver numa casa com quintal onde  permanecia horas sozinha, fez com que eu desenvolvesse  a capacidade de imaginar e criar, e também a de concentrar-me e entrar fundo no que estava fazendo.
Amadureci cedo, aos 10 anos sabia fazer bolo, cuidar de afazeres na casa e fiquei “mocinha”. A criança (contando com o periodo da adolescência inclusive) que ainda vive em mim, é crédula, ingênua, tranquila, feliz, criativa, “excessivamente” comportada, confiante em si em termos..rs.. e romântica. Foi no colégio das freiras quando criança, que recebi minhas primeiras asas de anjo... Hoje não sou mais anjo, mas guardo as asas e vôo com elas, sempre que posso por alguns minutos, para lugares onde recarrego baterias...rs..
  Tudo foram flores?? Não. Honestamente, gostaria que meu pai não tivesse se separado de minha mãe, que tivessem sido felizes juntos até o fim, sentimos muito a falta dele e ele a nossa. E, sobre minha mãe, gostaria que tivesse sido mais incentivadora, que fosse menos crítica e mais carinhosa. Contudo, apesar do amor que sinto por meus filhos, sei que não terei preenchido todas as suas expectativas. Somos todos humanos, temos falhas e necessidades. Penso que as pessoas de minha geração desejam que suas crianças brinquem mais e vivam por maior tempo a sua infância. Acho bom. Contudo,o que penso fazer falta realmente, é um olhar atento e carinhoso para o que a criança é e sente...hoje  me assusta um pouco o excesso de estímulos, brincadeiras e brinquedos, pois noto que isto não lhes permite desenvolver a capacidade de criar a partir do pouco, ou a se concentrar pelo menos até o final de uma brincadeira. Então, o desafio hoje, acho que é o concentrar-se apesar do excesso e filtrar o que é bom, do muito que chega. A criança de hoje talvez tenha mais trabalho que nós...
A criança que existe em mim saúda a criança que existe em cada um de vocês. 

4 comentários:

  1. Vera, afinidades... lendo sobre sua vida, a simplicidade deliciosa, momentos saudosos, lembrei tambem de minha vida.

    Sobre sua mãe não ser muito carinhosa, nem a minha! E somos doces, não é mesmo?! Os meus pais tambem se separaram e minha mãe tambem era muito exigente e critica!

    Voce já deve ter reparado que meus comentarios, quando falo sobre meus pais, falo dele, raramente dela. Embora ela tenha me "feito gente", ele me deu o que o dinheiro jamais compraria: afeto, atenção, ações incentivadoras - até as travessuras!!!!

    Por isso sinto tantas saudades dele...

    BEIJOS

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  2. Vera querida!
    Estou me tornando repetitiva, mas...não terão palavras diferentes para cada vez que leio um texto seu...Que maravilha! Qta beleza, lucidez, nostalgia boa. Vc disse sobre uma coisa que defendo muito - a frustração na infância nos ensina qdo adultos a fazer limonadas dos limões que a vida nos impõe.
    Mais uma vez adorei!e emocionei-me!
    Parabéns! Bjos

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  3. Sissy! Incrível mesmo nossas semelhanças apesar da diferença de idade etc.. mas há muitas coisas que muitas pessoas compartilham,sem se dar conta. Nós notamos isto, então podemos nos sentir meio "irmãs"... kkk.......
    Eu também sinto mais saudades do meu pai, apesar de admirar muito minha mãe e compreender como ela sofreu quando meu pai apaixonou-se por outra. Como marido,ele cometeu um grave erro, mas como pai e ser humano era gente demais, e vivia ajudando pessoas a serem atendidas no Hospital.Bem, é difícil exercer controle sôbre as coisas do coração.
    Beijos

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  4. Marcela! sinto-me agradecida por sua visita para um cafezinho no meu quintal, e pelo incentivo ao que escrevo.
    Você tem razão, pequenas frustrações na infância fazem parte e nos preparam para a vida adulta, quando os pais não nos protegem mais...rs.... Fico impressionada mesmo e penso com compaixão nas crianças que nascem e vivem nos ambientes de "guerra e fome extrema" - passam fome de carinho, de comida, do direito a ser criança e de brincar. Isto sim, é frustração que deveria poder ser evitada, não é? O resto, só nos fortalece e nos deixa mais desejosos de construir com responsabilidade, nosso caminho de paz e felicidade.
    Beijos a você Marcela e obrigada outra vez.

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