terça-feira, 16 de abril de 2013

Hoje ouvi o doce murmúrio de uma fonte...


Uma vez encontrei um tesouro. Não porque fosse ouro ou pedra preciosa de qualquer espécie, mas porque tinha, para mim, imenso valor. Porque surgira quando e onde jamais esperava, até porque eu nada mais esperava.
Eu o queria pra mim. E queria que quisesse me pertencer e me ter. Como o reflexo que, pelo que o reflete, vive. Como aqueles que pensam ser dois mas se sentem mais fortes porque são um. Ou vice e versa. Como o sonho que pensa que é dono do sonhador, e segue como se tivesse vida própria, porque o outro assim o permite, por amor.
Não era ouro, não era pedra, não tinha cor. Apenas eu o via e assim o sabia. Meu tesouro, o que era de valor, não tinha gosto, nem cheiro, nem forma que eu pudesse tocar, mas eu acreditava que saciaria minha sede, tão antiga como antigo era o meu mundo, por mais que eu tivesse sido feliz nele. Era como água cristalina e pura na qual eu queria mergulhar inteira, sem precisar me debater para não me afogar.
E vinha de uma fonte. Quando fui abraçá-la, sumiu. Nunca mais ouvi seu murmúrio, que para mim era como o barulhinho doce do riacho a correr lento sobre as pedras, nas sombras de um entardecer do verão que findava.
Foi tão surpreendente me dar conta desta visão nova para mim, que não queria perdê-la. Não podia!
Mas sumiu! Meu Deus, o que fiz eu?
Então, além das ventanias que há pouco acabara de enfrentar, e que nada mais eram do que o mal tempo já previsto embora não desejado, agora era o silêncio, a agonia do último sonho. Deparei-me com a culpa pela ousadia do sonho e por não ter sabido o que fazer com ele, e encarei o medo de envelhecer para sempre até lá de dentro dos ossos, até o fundo da minha alma, sem mais ser tocada pelo que parecia a fonte de onde nascia um arco-íris.
- Depois que se vive muito, é fatal envelhecer e desistir - assim me disseram.
Desisti. Pois desistir daquilo que não se pode ter é a coisa mais prudente e correta. E da desistência me veio a paz de quem volta a ser feliz, porque mais nada espera. Felizes os que não criam expectativas, já ensinou alguém a outros. Quem sabe por isto, para não criarem expectativas em relação às pessoas é que as pessoas tem tantos desejos então por possuírem coisas.....
Entretanto, tenho outra natureza, sou menos prudente do que me ensinaram...decidira guardar um segredo, apesar de tudo.
O meu segredo era apenas a imagem do que eu vi ou concebi um dia. Sem consistência ou verdade alguma, era mais verdadeiro do que tudo aquilo que podemos possuir, e ficamos anos lutando para não perder. E era meu. E estava em mim. O meu tesouro por si só era bom e sua presença me fazia bem, sem que eu pudesse interferir nisto, ou precisasse lutar para mantê-lo. Acho que ele é que me mantinha este tempo todo. E dele, que agora conscientemente estava em mim, me contentava em beber gotas. E por estar em mim, não será destruído enquanto eu não quiser, ou pelo menos enquanto conseguir me permitir ( sim, porque toda fonte que não se auto alimenta, um dia seca, pensei ).
  Eu brincava com ele, porque sabia que era apenas criação minha e não mais existia...Nem aquela que brinca existe.  Vive por trás de uma cara séria e compenetrada que envelhece agora, calmamente.
  Hoje, surpresa, ouvi um certo murmúrio e, ao duvidar, até senti alguns respingos em meu braço! Era verdade, estava lá! " Vi com estes olhinhos que a terra..."
   Surpreendentes são estas coisas que temos em nosso coração e, às vezes, agem como se tivessem vida própria! E como isto nos faz bem...Pra que fingir? se sei o que vejo e sinto, embora não explique.
  É como o personagem do livro que escrevemos e, de repente, nos surpreende com sua própria fala!
  Se eu pudesse, se fosse jovem, naquele momento meu coração teria saído pulando de alegria, feito uma cabrita, pela relva úmida! Ou, como mulher, na lua cheia, teria saído eu a dançar e rodar com os pés na areia e braços e cabelos ao vento! Mas tenho a dignidade dos que envelhecem com sabedoria...dos que querem ser felizes na paz, porque já sofreram.
  - ( Então, Psiu! quieta!). "Tudo é passageiro. Tudo é ilusão. O vento leva tudo". (Tudo o que é apenas exterior, eu retruco).
Nada é tão consistente como o que está no  coração( me lembrei), e isto sim, é de minha autoria, sabedoria de minhas entranhas. Seja no meu coração, ou no de quem quer que seja. Nada é tão verdadeiro quanto nossa própria mentira (ilusão) necessária, ou quanto nosso desejo insatisfeito e sedento que por algum tempo escondíamos de nós mesmos - Nada é tão verdadeiro quanto nosso sentimento. Não é preciso lutar com o que é verdadeiro. No amor se pode descansar.
  - Então, lembre-se...sim, tocar apenas o que realmente nos toca, o que é "real", pesar ação e reação na mesma balança, na mesma medida... se conseguir...parece ser uma boa norma para o bem viver a realidade deste mundo.

   ...Mesmo assim, não sou de negar o que sinto. Olhei pela janela. Eu já estava em paz, mas o dia, então, me pareceu por ora, mais azul e iluminado...  e tive de colocar aqui esta canção...estou nela...

Texto e foto: Vera Alvarenga
Canção : "Sonho de Ícaro" - Biafra

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