Eu também sonhei que tive uma visão. Ela me olhou de frente, olhos nos olhos, e me deu a mão.
Então me tomou em seus braços e me senti pequena, confortável e segura. Depois transformou-se numa ave com asas quebradas. Em seguida chorou, e fui eu que a abracei. E ela se tornou pequena, confortável e segura. Cuidamos uma da outra até que ela cresceu, e cresceu, frente a meu olhar. E eu a vi transformar-se numa ave formosa que voou, lá para o horizonte onde um arco-íris meio apagado tentava brilhar. Quando ela pousou nele, suas cores ficaram fortes e reais.
Ainda tenho a visão desta ave quando me sinto triste ou ameaçada no que sou. É apenas uma visão, mas posso vê-la quando preciso me sentir bela e viva como as cores do arco-íris. E lembro de abraçá-la quando temo que tenha se machucado. Lembro-me dela também nos momentos em que estou muito feliz.
Voltei a rir de mim mesma por me encontrar assim, num episódio melodramático, em que tristeza e beleza coexistem, como antes na literatura romântica.
Embora sinta uma tristeza imensa por saber que não passa de uma visão, e me pergunte por que eu tive aquele sonho, reconheço que o mundo ficou melhor depois disto.
Não, com certeza para alguns, não é proibido sonhar...
Texto e foto: Vera Alvarenga
Inspiração... a vida e Manoel de Barros.
"Aprendi que o artista não vê apenas. Ele tem visões. A
visão vem acompanhada de loucuras, de coisinhas à toa, de fantasias, de
peraltagens. Eu vejo pouco. Uso mais ter visões. Nas visões vêm as imagens,
todas as transfigurações. O poeta humaniza as coisas, o tempo, o vento. As
coisas, como estão no mundo, de tanto vê-las nos dão tédio. Temos que arrumar
novos comportamentos para as coisas. E a visão nos socorre desse mesmal."