Eu já amei o amor possível, da única forma que me parecia
ser possível amar – doce e inteiramente, com compaixão, gratidão e entrega
total.
Claro que esbarrei em meus limites e nos do próprio ser
amado, mas eles não me importavam. O importante e natural era o amor ser como
era.
Depois, muito tempo depois, um dia me apaixonei outra vez porque
de novo, o amor me tocou com seu encantamento, para meu espanto, de uma maneira
diferente - amei um amor que crescia apesar da distância, que existia apesar do
impossível.
Nos dois momentos, o ponto comum foi ser tocada por um amor
que me encantava, o que fez nascer o desejo da entrega, como se entregar-se a
tal sentimento com inteira lealdade possibilitasse transformá-lo em verdade que
pudesse sustentar-se e sustentar a nós.
Não amei porque estivesse farta ou desprezasse o amor possível.
Não tentaria explicar o que não se explica. Amei o impossível porque assim me encontrei, de
repente e inesperadamente, apaixonada. Então, tudo passou a ter novo significado
ao mesmo tempo que nada mais importava, porque o que era possível se dissolvia
como um barco naufragado em meio às ondas reais do tempo presente, numa
tempestade em alto mar. E
eu ainda lutava no meio de algo grandioso, assustada, quase afogando-me, apenas
agarrada a pequena estaca de madeira, pedaço talvez do mastro de uma antiga
bandeira. Mesmo com os olhos a arder do sal da lágrima e do mar, meu olhar
seguia o pássaro que voava livre em direção à terra firme e me inspirava a
sobreviver, não me deixando afundar.
Assim, posso dizer que já amei de várias maneiras, já salvei
o amor e fui salva por ele. Agora, ando na praia ao entardecer, tentando secar
minhas roupas com os últimos raios de sol e a passos lentos, marco na areia
meu rastro e sigo com esperança de que não sinta mais o frio das águas geladas
do mar revolto e profundo, que existe na solidão de cada um de nós...
Texto : Vera Alvarenga
Foto retirada do Google images.