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quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Carta de uma filha, a seu pai...

Resolvi postar aqui a carta que Juliana, filha do nosso amigo Toninho Scardua escreveu ao pai. É uma despedida e uma homenagem de uma filha amorosa ao pai...
Com respeito e meu carinho, um beijo para vocês.Vera.


Pai...
Uma semana sem você!
Como é difícil encontrar palavras para definir tudo o que você representa para nós. Isso por um lado é muito bom, pois mais uma vez me mostra o tanto de importância e qualidades que você sempre demonstrou ter.
Hoje, mais do que ontem e menos do que amanhã te nomeio LUTADOR. Um lutador constante. Um lutador que teve sempre muito bem definido o seu grande adversário: a própria vida. Digo que foi sua vida pois você lutou contra a pobreza, as barreiras, as dificuldades, as dúvidas, as dívidas e por fim a própria vida. Você foi um cara que desde cedo teve uma historia de luta, mas uma luta com a vida, sempre pelo melhor.
Você veio de uma condição de vida muito simples, que segundo suas próprias estórias, tinha apenas um sapato e um chinelo para dividir com seu irmão mais novo. Algumas vezes iam cada um com um, mas muitas vezes, vocês trocavam para os dois poderem ir de sapatos, enfaixavam um dos pés (para dizerem que estava machucado) e nele colocava um pé do chinelo e no outro pé o sapato. E assim os irmãos iam de pés invertidos para a escola, porém ambos de sapato como queriam. Este primeiro exemplo que me lembro dele ter me contado mostra um pouquinho de tudo aquilo que ele foi, realmente um cara sem limites, em todos os sentidos, para alcançar o que desejava.
Meu pai não se importava de chamar a atenção, ele não se importava de se expor, ele não se importava de fazer trapalhadas ele simplesmente se importava com uma coisa: a sua família. Família esta que Deus quis que se formasse e que meu pai construiu junto com minha mãe, família que em nenhum momento, por mais difícil que fosse, deixou-se abater. Sempre fomos unidos e assim continuaremos, pois aquilo que Deus constrói o tempo não destrói.
A criatividade e a sorte sempre foram suas aliadas em sua luta, luta esta para sempre proporcionar o melhor impossível em primeiro lugar para nós, mas ele nunca, jamais, se esqueceu daqueles que vinham em segundo lugar... sempre tentando agradar e ajudar todo mundo, ele não tinha jeito. Meu pai foi o maior exemplo que se pode ter para o velho termo “frita o peixe e olha o gato”, ele fazia isso como ninguém. Está certo que muitas vezes ele “fritou o gato e olhou o peixe”, mas posso afirmar com toda certeza que tenho em meu coração que em nenhum momento ele fez qualquer coisa, o mínimo que seja para prejudicar alguém.
A sua incomparável alegria de viver encantava e contagiava a todos por perto, e não havia que não deixasse escapar um sorriso com as sacadas dele. Uma pessoa sem igual.
Assim como eu disse para a mamãe, a nossa vida é como um grande e colorido quebra-cabeças, muitas vezes temos peças de uma mesma cor, do mesmo tamanho, mas nunca de um mesmo formato. Assim são as pessoas, muitas podem ser parecidas, porém nenhuma será igual a outra, nenhuma pessoa ocupará o espaço de outra pois estas “peças” são únicas e especiais, portanto insubstituíveis. Meu pai é, foi e sempre será uma dessas pessoas únicas e insubstituíveis, terá sempre seu lugar em nossos corações.
Enfim, a homenagem que eu queria deixar para você meu pai e para todos aqueles que gostam de você é que você foi um grande lutador, e até o último minuto da sua vida eu sei que você lutou com todas as forças que tinha para mostrar a sua bravura e vontade de viver. No entanto, todo grande lutador merece o seu descanso após enfrentar um grande adversário. Você enfrentou meu amigo, sou prova e companheira da sua luta e sei mais ainda que o grande lutador não se importa só com o resultado final do placar, mas sim com a vontade de vencer que faz com que permaneça no ringue até o último segundo antes do anúncio final. Agora, só resta dizer uma coisa: DESCANSE em paz. A sua luta deixou marcas e fez estória e, com certeza, ainda que tenha perdido a sua última grande luta, você é um VENCEDOR.
Esteja onde estiver sei que acompanhou cada palavra que escrevi, assim como cada sentimento que tive ao colocar no papel (ainda que virtual) esta mensagem. Fique em paz e contagie com sua alegria aqueles que aqui ficaram rezando por você, àqueles que aí onde está te receberam muito bem e àqueles que continuarão ao seu lado.

Até qualquer dia.
Com saudades e amor
Sua filha, Juliana




sábado, 5 de fevereiro de 2011

A bicicleta...

     Eu vejo meu vizinho, em algum momento de quase todos os dias, ali em frente, na calçada, conversando com algum amigo, ou limpando seu próprio carro, ou trazendo a mulher e os dois meninos de algum lugar, uma consulta talvez. São um casal de vida simples e ela está sempre atarefada com casa e família; quase nem saí ali fora. Ele faz compras, traz o gás. De vez em quando estaciona do outro lado da rua, os meninos descem do carro, e ele invariavelmente fala firme:
   - "Êh! olha a rua, garoto!", ou ainda "pera ái, menino"!
   Muitas vezes fala bravo e demonstra impaciência, chamando a atenção de um ou outro quando começam uma briga. E, às vezes, grita com um deles, mandando ir logo para dentro.
    No final desta tarde de sábado quente e preguiçoso, lá estava ele, com o filho maior, a ensinar-lhe a andar de bicicleta. Pela primeira vez eu o vi sem camisa. Devia saber que a tarefa a que se propunha, seria um exercício que lhe faria gastar calorias e suar em bicas. E como todo aquele que ensina um filho a andar de bicicleta, iniciou aquele vai e vem interminável  pela rua, empurrando e segurando a bicicleta com as duas mãos, dizendo algumas poucas palavras de incentivo. Eu tinha coisas a terminar no computador, mas era impossível deixar de olhar, de vez em quando.
   A porta de vidro do meu escritório que dá de frente para a rua, fica bem atrás do monitor. Notei que após algum tempo, ele já se distanciava mais, colocando apenas uma das mãos no banco, e de vez em quando abria os braços, feito galinha abrindo asas para proteger os pintinhos. Olhava para trás, quando o menino se desequilibrava ou vinha mais para o meio da rua e imediatamente, colocava a bicicleta na direção correta. Difícil tarefa, que requer coordenação, mas os pais geralmente estão preparados para ela. Tão mais fácil é corrigir a direção dos primeiros vôos dos filhos! A gente mora numa rua sossegada, mas bem numa curva, onde é preciso muito cuidado para não se surpreender e jamais se pode atravessar a rua ali, sem olhar atento para ambos os lados. Contudo, o pai fazia isto por ele e pelo menino, que ia afoito ultrapassando os limites do mundo, olhar fixo adiante, sem nem imaginar que não tivesse ali um anjo a cuidar da retaguarda.
   Até eu me preocupei. De vez em quando passam lá alguns carros ou motos barulhentos e numa velocidade que não combina com a calma do lugar. Contudo, as coisas correram como o esperado. Após muitas indas e vindas e dois tombos, pelo que percebi, o menino já andava sozinho.
   - Mãe, olha eu! E plóft, um tombo!
   E lá ia, novamente tentar, e feliz mesmo com o joelho levemente dolorido. Lembrei-me que foi minha prima que me ensinou a andar de bicicleta. Ela tinha quinze anos, eu sete. Caí, quando percebi que não estava mais me segurando,mas logo tentei novamente e consegui. A bicicleta era enorme para mim, e estávamos em um corredor do quintal. Quando eu dava impulso na coragem e nos pedais, e começava a sentir o vento no rosto, lá chegava o portão,quase a bater na minha cara. Tinha de coordenar a freagem com o rápido colocar os pés no chão, ou eu ia por terra. O mundo,naquele tempo, parecia menor, mas os quintais eram maiores! Para este garoto a sensação era de maior espaço e liberdade, pois a rua que sempre lhe fora proibida, agora era algo a explorar e a bicicleta, sendo apropriada a uma criança, por certo lhe proporcionava maior segurança.
   Notei que o pai estava cansado, mas orgulhoso. Não saía de traz do filho, lhe dando retaguarda, protegendo-o mas permitindo os dois tombos que presenciei. O menino se sentia cada vez mais confiante... e livre.
   - Pai, já sei í sozinho!  E foi mesmo, cheio de si. Por um segundo, o pai parou, coçou a cabeça, depois foi novamente atrás, protegendo.
   E pensei:
   - É pai, agora teu filho já sentiu o gostinho... e começou a te dizer adeus...o mundo hoje é bem maior...

Imagem: Google internet
Texto: Vera.
             

domingo, 8 de agosto de 2010

Hoje, senti saudades do meu pai!

Eu ia me calar, mas não deu.
Já tenho cabelos brancos, como falar das saudades que a gente sente, como se fosse outro dia, que ele esteve presente em nossa vida? Parece que não combina dizer :
- " Que saudade sinto do meu pai!", quando os cabelos estão tão brancos como os dele estavam, da última vez que o vi.
Hoje, foi um lindo dia dos pais, para meu filho, minha norinha e os pais deles! Apesar disto, senti sim, saudade imensa do meu.
Por que ?
Ah, não é apenas porque ele me carregava no colo, assobiava ou cantava para mim...
Não é apenas porque, mesmo depois que cresci, ele continuou me elogiando pelo que eu sabia fazer e me incentivando a continuar gostando de música, poesia, escrever, pintar...
Não foi apenas porque trabalhamos juntos e, eu vi como ele tratava os colegas de trabalho, desde o mais humilde até o chefe, da mesma maneira respeitosa e polida.
Um dia, eu já era casada, e ele foi me visitar. As visitas eram raras, porque ele sabia que minha mãe, depois que se separaram, não nos perdoava por ainda tentar vê-lo. Neste dia, ao acompanhá-lo até o carro, pude ver seu desespero ao ver que o carro havia sido roubado e ele não tinha seguro, nem condições de comprar outro. Suas primeiras palavras, ao constatar o fato foram algo que não esqueci:
- " E meus doentinhos? E agora?"
Não sendo ele um médico,logo compreendi que, ele estava preocupado porque havia trazido no carro, alguns exames RX de pessoas pobres, da cidade onde morava e que precisavam de atendimento no Hospital das Clínicas. E ele, ex-funcionário, contador aposentado e também doente, ao ir ao Hospital, iria interceder por estas pessoas!
Acima de tudo isto, o que me fez sentir saudades dele, foi porque ele foi o primeiro homem que amei! e pude amar, sem medo. E seu amor foi algo que ele nunca "retirou" de mim...sempre me ofereceu seu amor, sincero, verdadeiro, sem nenhuma condição, a não ser, estar disponível para receber este amor.
Então, foi por uma porção de coisas que eu recebi dele e aprendi com ele, que aos 20 anos, percebi que ele já tinha conquistado meu coração para sempre! E isto foi muito importante para que eu não tivesse medo de amar um outro homem!
     Nesta ocasião, nas vésperas de meu casamento, ele mostrou que era frágil e cometia erros! Minha mãe separou-se dele porque descobriu que ele estava apaixonado por outra mulher.Foi um desastre! Ela sofreu muito. Poucos meses antes de meu casamento, isto mexeu com meus conceitos a respeito de fidelidade e sôbre a eternidade do amor. Aprendi, também com ele, que o amor era coisa a ser cuidada com carinho, e que uma esposa tinha que ser uma boa amante também. Mas não sei se era esta a questão. Ele me disse que não sabia  que diabos havia acontecido com ele, para que se apaixonasse assim por outra mulher, sendo minha mãe uma mulher de tanto valor, mas que não pode evitar, pois havia encontrado a mulher companheira para o resto da vida dele. Todos nós , 4 irmãos, sofremos algo indescritível: como poderíamos amar nosso carinhoso pai, sem culpa, se ele havia feito nossa mãe sofrer tanto? A partir daí, penso que todos nós ficamos divididos, o que não é muito saudável, nem confortável! Minha mãe não perdoou nossas pequenas traições de filhos que queríamos continuar a amar aquele pai. E, cada um resolveu isto como pode! E tirou daí as lições que conseguiu ver.
   Não sei quanto isto influenciou em minha vida como mulher e esposa. E certamente, isto aconteceu. Contudo, sei o quanto o amor que ele me deu como pai que era, e seu jeito simples de amar a vida e as pessoas me influenciaram, e me permitiram não querer me fechar ao amor. Quem recebe, em criança, amor dos pais, ou de um deles, nunca esquece e, é deste amor incondicional, que aconchega e abraça, que a gente sempre vai sentir saudades. Isto ocorre, mesmo que o tempo passe, e seja a gente que venha a amá-los desta forma, quando estão mais frágeis, de cabelos brancos, e precisam mais do nosso amor. Amor dado, amor retribuído, com o mesmo coração e disponibilidade. É assim a vida, e sou feliz por ter saudades de um pai que foi amoroso!

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